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21.9.07

Greenspan e o populismo brasileiro

Sergio Malbergier, na Folha Online

Um desses grandes teóricos da conspiração judaico-capitalista de dominação global ainda virá com a tese de que Alan Greenspan, presidente do banco central dos EUA de 1987 a 2006, calibrou os mercados para que estourassem nas vésperas de lançamento de seu livro sobre os mais de 18 anos que passou no principal posto público da economia global.

A interrogação que paira hoje sobre os mercados financeiros aponta para Greenspan. Suas entrevistas para o lançamento do livro geraram manchetes econômicas ao redor do globo e ajudarão a editora Penguin Press a recuperar os US$ 8 milhões de adiantamento pagos ao autor. "A Era da Turbulência", lançado aqui pela Campus, vale cada centavo investido para quem quer entender melhor essa fase financeira do capitalismo, vista por um de seus principais protagonistas, concorde-se ou não com ele.

O Brasil ganha destaque (positivo) no capítulo fatidicamente intitulado "América Latina e Populismo". Logo no início, refletindo sobre as mudanças radicais do Plano Real (1994), dispara: "Como uma economia pode ser tão mal gerenciada a ponto de exigir reforma tão drástica?"

Sua admiração pelo capitalismo libertário gera em Greenspan um horror à praga populista que encontra no atraso institucional e social latino-americano fértil terreno. "A melhor evidência de que o populismo é basicamente uma reação emocional, em vez de algo baseado em idéias, é o próprio fato de não recuar, mesmo em face de reiterados fracassos", escreve ele, com certo sarcasmo, olhando para a história da região.

O voluntarismo econômico, que não respeita o que Greenspan considera leis inescapáveis do mercado, levou o Brasil a perder anos valiosos de crescimento com planos mirabolantes contra a inflação e a pobreza que acabavam aprofundando os males que pretendia combater. Greenspan explica que o erro fatal dos populistas é não perceber (ou fingir que não percebem) que todo movimento voluntarista pretensamente positivo desequilibra os mercados e gera outros movimentos negativos que acentuam os problemas econômicos. Escreve Greenspan:

"O populismo econômico imagina um mundo mais simples e direto, no qual as estruturas teóricas não passam de dispersões em relação às necessidades evidentes e prementes. Seus princípios são simples. Se há desemprego, o governo deve contratar os desempregados... Se as importações estão ameaçando empregos, proíba as importações". É um discurso que, infelizmente, ainda ouvimos no Brasil.

Economistas importantes, como os tucanos Luiz Carlos Mendonça de Barros e Yoshiaki Nakano, acusam o governo Lula de fazer "populismo cambial" por causa do real forte que barateia produtos importados e eleva o poder de compra da população, mas ameaça a indústria nacional. É um debate pertinente, que deve ser travado, sempre lembrando que o dólar mantido artificialmente baixo na virada dos governos FHC1 para o FHC2 ajudou a reeleger nosso então presidente.

Mas Greenspan, admirado por Pedro Malan (que escreve introdução à edição brasileira) e Armínio Fraga (que escreve a contracapa do livro), parece endossar o lulismo econômico tanto quanto as políticas da era FHC, apesar de manifestar surpresa com o fato de o petista ter mantido a mesma política econômica do antecessor.

"Será que uma sociedade com profundas raízes populistas é capaz de mudar com rapidez?", indaga Greenspan genericamente. Sua resposta: o Brasil, especialmente o Plano Real, sugere que a façanha é possível. "A economia brasileira parece estar funcionando em favor do povo brasileiro", escreve. Falta agora os políticos brasileiros funcionarem em favor do povo brasileiro.

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